
Músicas, festas, crianças, pets… Em condomínio tem barulho, e é sempre desafiador para o gestor de condomínio prezar pela Lei do Silêncio.
O barulho é uma das razões mais frequentes de conflitos entre moradores e condôminos, e é papel do síndico mediar esses atritos e encontrar uma saída que satisfaça necessidades, e garanta os direitos de todos.
Nesse contexto, conhecimento jurídico sobre a questão é fundamental para basear as decisões tomadas.
Neste artigo, vamos delinear as questões que envolvem a Lei do Silêncio em condomínios, e como gestores, conselheiros, condôminos e moradores podem se adequar e fazer valer a legislação, prezando pelo conforto de todos os habitantes do condomínio.
Lei do Silêncio: do que se trata?
Não existe “Lei do Silêncio”!
Calma, calma… A gente te explica.
É que a conhecida “Lei do Silêncio” não é propriamente uma lei, mas um conjunto de regras federais, estaduais e municipais, que limitam a liberdade das pessoas de fazer barulho.
O Código Civil, a Lei de Contravenções e regulamentações técnicas apoiam essas legislações menores que definem, em diferentes lugares, como funciona essa limitação da liberdade.
Na Lei de Contravenções Penais, que define crimes de menor categoria, mas ainda sim passíveis de punição, define como contravenção:
“Art. 42. Perturbar alguem o trabalho ou o sossego alheios:
I – com gritaria ou algazarra;
II – exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;
III – abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;
IV – provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda:
Pena – prisão simples, de quinze dias a três meses, ou multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.”
Isso garante a proteção das pessoas (seja em condomínios ou residência de rua) quanto à privacidade, tranquilidade, sono e descanso.
Assim, qualquer situação que gere barulho excessivo e incômodo fica proibida.
Entretanto, como em geral as pessoas costumam funcionar pelo bom-senso, os horários mais críticos para aplicação da lei (reclamação, denúncia e abertura de boletim de ocorrência) são à noite.
Afinal, é esperado que, de vez em quando, as pessoas realizem festas, comemorações, e é natural que nesses momentos haja mais barulho. Se houver respeito e diálogo entre os vizinhos, essas situações podem ser arranjadas de forma a satisfazer a todos.
Lei do Silêncio em condomínios
Nos condomínios, esse assunto dá o que falar.
O inciso IV do artigo 1336 do Código Civil, sobre os deveres dos condôminos, versa:
“IV – dar às suas partes a mesma destinação que tem a edificação, e não as utilizar de maneira prejudicial ao sossego, salubridade e segurança dos possuidores, ou aos bons costumes.” (grifo nosso)
Portanto, também inclui-se aí o barulho excessivo. Mas, como se define o que é excessivo ou não?
O que é considerado barulho excessivo?
Essa definição não é única. Ela depende de normas técnicas e legislações municipais, que estabelecem limites de decibéis permitidos em certos horários.
Normas regulamentadoras, como a NBR 10.151, tratam da avaliação de ruídos em áreas habitadas, e baseiam as legislações municipais.
Em média, em zonas residenciais, o ruído não deve ultrapassar 50 decibéis durante o dia e 45 decibéis à noite. Lembrando que isso sofre variações conforme o município, portanto, confira nas leis municipais do teu município o que está valendo!
Para tu ter uma ideia, 50 decibéis correspondem ao volume de uma conversa em tom normal.
O rádio do teu carro, em volume médio, pode ultrapassar 80 decibéis. Dentro de um apartamento, esse nível já é mais que suficiente para perturbar o vizinho no período noturno.
Portanto, uma festa com música alta, barulho de construção e latido constante de um cachorro podem facilmente ultrapassar esse limite, e serem considerados como infração.
O síndico de condomínio deve conhecer a legislação municipal e contar com apoio técnico para fundamentar suas decisões.
Regulamentação do barulho em condomínios
As normas gerais sobre barulho e ruídos dentro dos condomínios devem estar no Regulamento Interno e na Convenção Condominial.
É importante que os documentos tenham as previsões para:
- horário de silêncio (em geral, entre 22h e 7h, podendo variar segundo o perfil do condomínio);
- regras para obras (horários e dias permitidos);
- condutas esperadas nas áreas comuns (piscina, salões de festa, academia), que podem incluir observações sobre ruídos;
- penalidades previstas em caso de descumprimento, incluindo advertência, multa ou ação judicial.
São essas regras internas que dão segurança jurídica à administração, facilitando, quando necessário, mediar e resolver conflitos sem a necessidade de acionar autoridade externa.
Qual o papel do síndico diante de reclamações?
Ao síndico cabe também mediar as relações entre moradores/condôminos. Sua ação deve ser imparcial, possuir base legal e bom senso.
Quando receber uma reclamação por barulho, o síndico se beneficia de ter um protocolo a seguir:
- Registro de ocorrência: descrever a reclamação, por escrito, via e-mail, aplicativo ou livro de reclamações.
- Verificar: buscar confirmar o fato, ouvindo outras pessoas ou fazendo visita;
- Diálogo com o morador responsável pelo barulho: buscar resolver amigavelmente;
- Aplicação de penalidades: se houver reincidência ou descumprimento de regras;
- Acionar autoridades: em último caso, se houver reincidência frequente, com impacto no sossego e bem-estar coletivo.
A indicação é sempre tentar resolver através do diálogo sadio e não-violento. Omissão é inaceitável, pois é dever do síndico garantir os direitos dos condôminos e moradores.
Quando acionar as autoridades?
Caso as medidas internas de mediação e diálogo não resolvam, o síndico pode acionar a polícia/brigada militar ou a guarda municipal, a depender da cidade onde o condomínio está.
A denúncia é embasada no artigo 42 da Lei de Contravenções Penais, citada acima, e o agente pode:
- registrar um B.O;
- determinar o encerramento da atividade (terminar a festa, desligar o som);
- aplicação de multa ou condução do responsável à delegacia, se houver resistência.
Para se resguardar juridicamente, o síndico deve ter o registro das ocorrências anteriores, deixando uma prova de que houve tentativa de solucionar a situação de maneira pacífica antes de recorrer às autoridades.
Como evitar conflitos por barulho
Melhor do que remediar é prevenir, e esse deve ser o objetivo do gestor condominial.
Algumas práticas podem ser interessantes para manter a boa convivência em condomínio, e evitar o uso punitivo da Lei do Silêncio.
Confira ações interessantes para esse objetivo:
- Promoção de campanhas de conscientização sobre respeito ao silêncio e as diversas normativas que compõem a Lei do Silêncio;
- Utilizar avisos visuais sobre as regras nas áreas comuns (elevadores, murais, grupo de WhatsApp do condomínio);
- Orientação dos novos moradores sobre as regras logo após a mudança;
- Incentivo do uso responsável de espaços de lazer, com comunicações em geral, conversas, durante as assembleias;
- Realizar assembleias temáticas sobre convivência, buscando encontrar soluções viáveis, se o tema gerar muitos atritos no teu condomínio.
Viver com condomínio exige empatia e respeito mútuo. O síndico, com habilidades, atuação firme e conhecimento da lei, é o guardião das boas relações e do bem-estar de todos os moradores.
Criar essa cultura de boa vizinhança é essencial para evitar este e outros problemas de convivência.
Conclusão
A Lei do Silêncio não é uma lei, mas sim, um conjunto de normas e orientações que asseguram o direito ao sossego a todos.
Principalmente em condomínios, o direito ao sossego deve ser trabalhado pela educação comunitária, estabelecimento de regras claras, e de gestão responsável, com comunicação constante e incentivo à boa convivência.
Organizar e promover ações para o cumprimento das normas de silêncio nos condomínios protege o conforto, o bem-estar e a saúde de todos os moradores, permitindo ainda que eles comemorem, vivam seus hobbies e seus momentos especiais com respeito e empatia.